quarta-feira, outubro 18, 2006

Festival Abismo ‘06 - Visto por um “festivaleiro”

O texto que se segue não é mais do que uma visão sobre o Festival Abismo, visão de quem esteve no lugar do público. Como sabem, fiz parte da organização, pelo que não tinha lógica ser eu a fazer a review deste evento. Seria, no mínimo, pouco imparcial e inadequado. Sendo assim, aqui vai uma opinião sobre o evento, de quem esteve lá como espectador. É uma descrição muito pessoal, directa e realista e toda a responsabilidade deverá ser pedida a quem o assina. (Miguel Linhares)


Texto – Marco Coelho / Fotos - Soraia Bettencourt
(para mais fotos sobre este evento, visitem www.festivalabismo.viaoceanica.com )

Pela primeira vez na ilha Terceira, foi organizado um festival desta dimensão e que englobou diversos géneros musicais. O Festival Abismo ’06 presenteou-nos, também, com espectáculos variados, como o teatro, vídeo jogos, “body painting”, entre outros.

15 de Setembro 2006
Neste primeiro dia do evento, as coisas não correram como planeado. Primeiro foi o mau tempo que resolveu fazer a sua gracinha, depois os problemas eléctricos.
O gerador que “alimentava” o palco principal avariou ao início da tarde. A organização tudo fez e acabou por arranjar outro que o substituísse, ainda mais potente. Quando tudo parecia bem encaminhado, o segundo gerador fez o favor de avariar também. Com isso, e com o adiantado das horas, só foi possível a actuação dos Dj’s, pela potência necessária ser muito inferior à das bandas.
Por volta das 24h00 subiu ao palco o DJ FBO (TER), que chegou relativamente atrasado, devido a uma mega intervenção policial no exterior do recinto (se a Policia fizesse estas operações stop no final das touradas à corda com o mesmo afinco que o fazem nas festas nocturnas, aí sim, metiam metade da ilha a andar a pé!).
Quanto ao FBO, este começou o seu set sem grandes ambições. Entrou muito numa onda house-comercial, mas, mesmo assim, conseguiu trazer o público para a frente do palco. Com o evoluir do set, o artista terceirense começou a “entrar” mais no som progressive/tribal que nos habituou em outros eventos.
De seguida subiu ao palco o “cabeça de cartaz” deste primeiro dia, o Dj Carlos Manaça (LX), que a meu ver esteve algo mal, visto que começou muito cedo a passar underground, o que é uma sonoridade muito “twilight zone” para as 02h00. Mas tirando isso, esteve bem com poucas falhas, e agradando os espectadores presentes.

16 de Setembro 2006
Com os problemas eléctricos do dia anterior, a organização viu-se obrigada a passar os concertos (quase) todos para este dia de Sábado.
A abrir a noite estiveram os Overload (TER), a banda com uma sonoridade Rock/Goth, a meu ver estiveram muito bem, conseguindo mesmo arrecadar alguns aplausos e, até mesmo, a difícil proeza de fazer a audiência deslocar-se para a frente do palco. Tirando um ou dois pormenores, arrisco a dizer que foi das melhores actuações da banda, embora não se tenham apresentado ainda muitas vezes ao vivo e pelo que tenha presenciado.
Seguiram-se os Manifesto (TER), banda que já tem 10 anos de existência, mas estão como o vinho do porto. Os Manifesto apresentaram-se em palco, para o seu único concerto este ano, com dois novos elementos (Foggy e Leão, ou Flash para os amigos), que desempenharam as suas funções primorosamente.Com temas como “Estrela Vermelha”, “Sol da Plenitude” e o já “famoso assassinato” à música de Zeca Afonso, “O que faz falta”, conseguiram trazer uma contagiante animação ao evento. Nota muito positiva para esta actuação.
Chegou o momento de entrar em palco a terceira banda da noite, os Anomally (TER). A banda local de Death/Trash, a meu ver, fez uma actuação exemplar, com bastantes melhorias em relação ao festival AngraRock! Também não sei até que ponto as melhorias não foram devido à excelente qualidade de som existente no Festival Abismo, mas isso “são contas de outro rosário”. Devido à boa actuação, os Anomally conseguiram “estragar” o trabalho das duas bandas anteriores. No bom sentido. Não me interpretem mal, mas apesar da sua excelente sonoridade, a mesma não agradou muitos dos espectadores, que, infelizmente, se começaram a afastar do palco. Uma coisa é certa, se fossem os Liquido a tocar a mesma coisa, o recinto tinha ficado ao rubro, com todos a gritar, saltar e até faziam “pseudo-mosh pits”. Mas enfim, o que é que se pode fazer?! O terceirense é mesmo assim, os de fora são sempre melhores.
Vamos agora ao momento mais esperado (por muitos) da noite, o regresso dos Lithium (TER), a banda que após algum tempo de interregno voltou em força para este festival. Com um reportório reduzido (tal como quase todas as bandas) devido à sub carga de bandas neste segundo dia de festival, os Lithium conseguiram uma actuação muito boa. Temas como “Enclosured”, “Lost Horizon” e “As Lies Unfold”, deliciaram os presentes, chegando mesmo a levantar pequenas nuvens de poeira no recinto.
No entanto, foi de lamentar que a duas músicas do fim da actuação, o Sr. técnico de som tenha resolvido “brilhar” (pela negativa), e cortou o som sem avisar nada nem ninguém, deixando a banda “pendurada” a tocar para as paredes. Nem os rapazes despedirem-se do público. Nota positiva para os Lithium e cartão vermelho para o técnico de som.
(n.r. – este incidente entre o técnico de som e o conjunto Lithium, já foi explicado numa nota de imprensa feita pelo próprio visado que assumiu e reconheceu a culpa neste acto injustificável.)
Era chegada a hora dos Peste & Sida entrarem em palco. Com 20 anos de carreira, alguns deles, essencialmente na primeira metade da década de noventa, nos top´s nacionais de vendas e com um projecto paralelo que trouxe ainda mais reconhecimento (Despe & Siga), esta banda, que esteve parada nas lides musicais durante alguns anos, voltou à carga em 2003 com alguns membros da formação original e o principal mentor e motor dos próprios Peste & Sida, João San Payo, de corpo e alma. Pela primeira vez a actuarem na ilha Terceira (estiveram como Despe & Siga em 1995, nas Sanjoaninas), os Peste & Sida entraram com uma instrumental do último álbum que serviu para adocicar o ambiente. A partir daqui foi uma hora e meia, quase toda ela, com êxitos que já são parte da história do Rock Português. Entremeando com alguns temas novos e/ou menos conhecidos do público em geral, temas como “Sol da Caparica”, “Paulinha”, “Veneno” ou “Chuta Cavalo” serviram de mote para “revirar” o Festival Abismo! Muita energia, em cima do palco e cá em baixo onde a poeira era já muita e as grades já quase saltavam, com o público efusivamente a responder à chamada da banda. Ainda houve tempo para a “Bule Bule”, tema que foi readaptado para Português pelo João San Payo e foi celebrizado pelos Despe & Siga. Muita vida, energia e boas vibrações nesta primeira presença de um dos mais carismáticos grupos Rock portugueses. Deixaram um sorriso no público e saíram, a sorrir. Um concerto a repetir!
Depois desta obra de arte e como não podia deixar de ser, foi a vez da electrónica entrar em palco. Desta vez a cargo de DJ Bruno (TER), que com uma sonoridade “old-school” house (acabei de inventar uma categoria nova), conseguiu meter o recinto aos saltos. Mas, o Dj não veio sozinho, a acompanhar a sua batida tivemos um (pseudo) MC, que quase conseguiu estragar o trabalho todo ao rapaz. Não me levem a mal, mas para se ser um bom MC não é preciso repetir a mesma frase, ou palavra, quinhentas vezes…foi um pouco repetitivo e sem “sumo” nenhum. Tirando isso, esta actuação foi muito boa.
XL Garcia (LX), o que dizer?! Nada, o homem é um “monstro dos pratos”, no seu inconfundível estilo progressive. XL Garcia levou o recinto ao auge deste festival. O mais engraçado de tudo no set foi, na segunda música, estava o XL a meter o seu som poderoso… quando… adivinhem quem aparece? É verdade! O MC sensação. Mas pronto, não chegou a falar.

17 de Setembro 2006
Este terceiro e último dia de festival foi marcado pela falta de adesão do público, pelo que o recinto se encontrava “ás moscas”, comparado com os dias anteriores. Mas não foi isso que impediu a realização do evento.
À hora marcada subiram ao palco os Amnnezia (TER), banda com uma sonoridade pop-rock muito bem conseguida, excelente voz (feminina), boa presença e atitude, alguns temas originais outros covers. Não posso falar muito mais desta banda, porque durante uma parte da actuação não me encontrava no recinto.
Chegando a casa e com a transmissão via Internet já a funcionar, tive o prazer de poder ver Othello (TER). A banda esteve muito bem, como também já nos vem habituando, com uma sonoridade alternative. Houve aquela parte em que não se percebia muito bem, na transmissão on-line, porque o cameraman parecia estar confuso com os dedos e fazia zooms excessivos, deixando-nos (web-espectadores), com a sensação de estar a andar de barco. Mas quanto aos Othello, souberam lidar muito bem com a falta de público e fizeram o seu trabalho na perfeição.
A actuação de M.A.U. – Man and Unable – (LX), provou que a banda é um aliciante projecto musical com bastante “sumo” para além do rótulo de banda comercial, como se poderia sugerir pela inclusão de um dos seus temas num anúncio de uma rede de telemóveis. De facto, os M.A.U. tiveram uma actuação bastante segura, conseguindo pôr a saltar o – infelizmente – pouco público presente. A banda aposta na diversidade de estilos, integrando desde solos de guitarra a um MC. O seu som pop/electrónico acabou por ser uma óptima escolha para último concerto do festival, já que a boa disposição era a palavra de ordem e as energias começavam a faltar a alguns dos “festivaleiros” que por lá andaram os três dias. Assim sendo, temas como “I Need a Priest”ou “Corporation in Heat”, animaram o recinto e revelaram o elevado nível de qualidade que a banda apresenta, bem como a sua capacidade de agradar a variados públicos. Sintetizando, a ter em atenção o desenvolvimento dos M.A.U. nos próximos anos, já que provaram no Festival Abismo que o projecto é ambicioso, mas realista. Boa sonoridade liderada por um vocalista dinâmico, bem apoiado por uma percussão consistente e pelas teclas que constituem uma agradável surpresa, com excertos a fazer lembrar os “disco hits” dos 80’s. A versatilidade é o grande trunfo desta banda, que durante mais de uma hora abrilhantou o desfecho do festival.
Chegada estava a hora das surpresas do Festival, Dj´s Ishan (SMG) e ALIF (LX). Sinceramente não podiam ter escolhido melhor forma de acabar este festival!
O primeiro com um som Trance muito bem trabalhado, deixou-me de boca aberta, sempre muito activo e a saber “levar” o público para um quase “ponto de rebuçado”.
Quanto ao lisboeta, com uma sonoridade dentro do Drum-n-Bass levou a audiência ao rubro, até mesmo em casa eu estava aos saltos. Desculpem-me não aprofundar mais mas este tipo de som não é minha especialidade. Gostamos e pronto!
É também de salientar o espectáculo de pirotecnia que decorreu durante a actuação destes 2 Dj´s. Por fim – não pensem que me esqueci deles – os Dj´s/animadores Lino e João Luís (TER), que tiveram o grande trabalho de animar os presentes na Zona Chill Out, com uns after-hours muito interessantes. Muito bom, mesmo.
Em jeito de resumo, este festival teve nota positiva, em todos os aspectos e tomara que existam muito mais iniciativas destas. A única coisa que tenho a apontar é a data escolhida para o evento. 15,16 e 17 de Setembro já é muito tarde para este tipo de eventos, pelo menos aqui na Terceira. As aulas já haviam começado, muitos dos nossos estudantes universitários já cá não estavam e infelizmente há que trabalhar na 2ª feira...

Para quem quiser uma leitura mais pormenorizada deste texto, visitem http://the-couch.blog.com

in jornal "A União", 18 de Outubro, 2006

1 comentário:

Anónimo disse...

antes de mais gostaria de agradeçer a oportunidade de poder escrever um artigo para o jornal :P, mas o melhor de tudo foi poder escrever sem censura, tal como as coisas aconteceram, se bem, que o texto teve que ser corrigido, para não ser tão "bruto".
a versão original do artigo pode ser vista em http://the-couch.blog.com/1167023/

Mais uma vez obrigado.