quinta-feira, dezembro 09, 2004

Eu escrevo = eufemismo

O tempo é tão voraz que o dono do mesmo perde a noção do referido. Ainda agora começo a escrever e já estou baralhado! Se ao menos eu não escrevesse, não me baralhava. Porcaria de vício este, podia fazer tantas outras coisas…porque é que escrevo? É uma das coisas que mais gosto fazer, posso não dizer nada, mas escrevo tudo. Passar o tempo a escrever é uma forma anímica de alimentar as minhas ansiedades, desejos e sonhos, sob a silhueta de várias ideias, é descodificá-las, apresenta-las ao papel e ao mesmo tempo dar-lhes vida. É poder dizer tudo aquilo que quero sem ninguém me interromper - ai como odeio isso - e poder especular sobre o que quiser, para depois eu próprio criticar. Narcisismo, tão vil sentimento! Até há pouco tempo atrás, reservava-me e nunca mostrava o que escrevia, a ninguém mesmo! Talvez considerasse todos aqueles jogos de letras muito pessoais e reveladores da minha personalidade, consequentemente, dos meus defeitos. Até que um dia achei que mais alguém, além da minha pessoa, deveria ser incomodado com a tinta que gasto, quer dizer…, o código binário impera e passei a gastar mais electricidade e menos papel e tinta. Modernices! Então decidi opinar publicamente na comunicação social local. Por acaso, e agora rio-me, aqueles rabiscos incomodaram alguns senhores, engraçado, pensava que só dizia tolices e que com tolices ninguém se incomodava… em frente! Depois comecei a escrever para este jornal e com mais alguma responsabilidade, pois era sobre um assunto delicado e susceptível de muitas opiniões que quase de certeza serão opostas à minha. Homessa! Porque é que não concordam com aquilo que digo?! Tinha quase a certeza que era dono da razão… assim como o Copérnico tinha em relação à centralidade da Terra perante o Universo. Fantástico, dessa certeza, nada nos demove. Mas será que alguém se revê na minha escrita, pergunto eu? Será que alguém sente-se incomodado pelas mesmas partes sinistras do mundo que eu? Será que alguém, como eu, pensa que aquilo que escrevo não é escrever e aquilo que vejo não é ver? Bolas, lá estou outra vez a ser negativo! Coisas estas que me seguem e que não as explico, porque senão baralho-me. E se me baralho, é porque as escrevi.
in Jornal "A União", 8 de Dezembro 2004

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